segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Sempre Que Te Vejo – OBRA COMPLETA

 

Sempre que Te Vejo

 COVER

Capítulo I – Memórias de Criança

Nada é mais inocente do que uma criança. A criança que brinca, corre, tropeça, chora, mas no fim esboça sempre um sorriso, um sorriso de esperança para aqueles adultos que vivem no ódio e na tristeza. A criança representa a felicidade, a alegria e a esperança.

- Olá José. Preparado para mais um dia de aulas? – perguntou a professora.

- Sim, senhora professora. – respondeu ele, e entrou na sala.

- Não dás um beijo à tua avó, José? – perguntou a professora.

- Deixe lá professora. Ele quer ir brincar com os amigos. – disse a avó do José.

- Então, está entregue.

- Bom dia professora. Com licença. – disse a avó do José, e foi embora.

José já estava junto com os amigos a brincar. O jardim-de-infância era uma alegria. As crianças brincavam, cantavam, dançavam, sem sequer fazer ideia do mundo que as espera, lá fora.

- Olá Júlia.

- Olá José. Queres brincar comigo? – perguntou a amiga.

- Sim. E vamos brincar com o quê?

- Humm...talvez com os carros! – disse Júlia.

- Está bem. Mas não queres antes brincar com as bonecas? Como és rapariga…

- E? O que tem uma coisa a ver com a outra? Anda lá, vamos…

José e Júlia foram brincar com os carros. Os sorrisos nos seus rostos eram contagiosos, partilhavam tudo, apoiavam-se e davam força sempre que um deles estivesse mais triste. Eles partilhavam entre si todas as suas alegrias e tristezas.

Todos os dias sempre que terminavam as aulas, a avó de José ia busca-lo à escola, e levava consigo Júlia. Em casa, os dois amigos continuavam a brincar, depois iam dormir um pouco para descansarem e mais tarde a mãe de Júlia vinha busca-la para ir para casa. A mãe de José chegava do trabalho e fazia o mesmo. A rotina de José e Júlia era mesmo assim. Como duas almas gémeas, inseparáveis.

- Júlia, vamos brincar?

- Espera um pouco, estou cansada… - dizia ela enquanto suspirava.

- Fogo! Estás sempre a cansar-te. Fraquita! – disse José.

- Tu é que és fraquito! – resmungou ela.

- Ai é? Então anda-me apanhar…. – disse José e desatou a correr com Júlia atrás de si.

 

Os anos foram passando, José e Júlia entraram para a escola primária. Os carros, as bonecas, já começam a ser menos frequentes no dia-a-dia dos dois amigos. Agora sempre que chegavam a casa, faziam juntos os trabalhos de casa, ajudando-se um ao outro, e só depois iam brincar.

- José quanto é que é sete mais cinco menos quatro? – perguntou Júlia.

- Humm… oito?! – questionou José.

- Sim. E nove mais oito?

- Dezassete! – respondeu José.

- Já estão os trabalhos de casa todos feitos. Vamos lanchar? – perguntou Júlia a José.

- Vamos. Já estou cansado disto.. – disse ele aborrecido.

Os quatro anos de ensino primário passaram assim. As descobertas que iam surgindo, uma nova letra a aprender, um novo problema a resolver era assim a vida na escola primária. Os passeios, os lanches e as habituais sessões de estudo eram os eixos de José e Júlia naquela fase da vida. Quando terminaram os estudos primários, os dois amigos entraram numa nova escola. O sentido de responsabilidade começou a pesar sobre eles. Uma nova escola, uma outra localidade, novas pessoas, tudo começou a enfraquecer os laços entre estes dois amigos. Já era menor o tempo em que estavam juntos. As tradicionais sessões de estudo, deixaram de existir, as brincadeiras igualmente. Desde que entraram na nova escola, José e Júlia já tinham feito novos amigos. Ana e Diana foram algumas das amigas novas, de Júlia. José preferiu manter-se afastado, dando inicio a um ciclo assustador da sua vida.

 

Capítulo II – O Novo Ciclo

O segundo ano do ensino básico chegara. Júlia agora passava grande parte do seu tempo com as suas amigas, Ana e Diana. As conversas de meninas, as descobertas da idade e as primeiras paixões foram os principais motivos que levaram Júlia a aproximar-se cada vez mais das raparigas. Júlia era vista por todos como uma pessoa popular.

O pesadelo de José estava prestes a começar. Invejado pela amizade que tem com Júlia, José começa a ser vítima de maus tratos por parte dos colegas.

- Pará! Qual é o teu problema? Que mal é que te fiz? – perguntava José.

- Calou… aqui não abres o bico! – dizia um dos agressores.

José também retribuía os murros, os empurrões e os pontapés que recebia, mas um contra quatro é sempre mais difícil de enfrentar. José começou a perder as forças de lutar, sentia que não valia a pena mostrar que não era fraco e foi ficando cada vez mais deprimido. As agressões a José continuavam sempre que por ele passavam, ora um murro ou um pontapé, José não escapava. José sentia-se vitorioso quando a guerra era verbal. Aí ele lutava com todos os seus argumentos sem dar o braço a torcer.

- Não vales nada, burro. – diziam eles a José.

- Ao contrário de alguns não compro amizades…  - respondia ele, mas antes de acabar a frase já estava a ser atingido por eles.

José refugiava-se ora num ou outro canto da escola. A sua amargura, o ódio, faziam uma grande tempestade na sua cabeça, e a fúria era tal que nem conseguia derramar uma lágrima. A falta de coragem de pedir ajuda, e de se impor e fazer frente revoltavam José. No fundo ele sabia que coragem era o que mais precisava para tudo na vida, mas foi sempre esse o seu ponto fraco.

O afastamento de Júlia era cada vez mais notável. Continuava com as suas amigas, a discutir as tendências da moda, a discutir sobre os rapazes, os cremes novos que tinham, e nem sequer reparara no que se estava a passar com o seu amigo.

- Júlia queres fazer par comigo no trabalho de matemática? – perguntou José.

- Eu vou ficar com a Ana e a Diana. Arranja outro par. – disse ela.

- Eu arranjo. Não te preocupes.

- Quem não tem grupo? – perguntou a professora.

José levantou a mão. Foi o único.

- Ficas com a Diana, a Ana e a Júlia.

- Está bem professora. – respondeu José.

Embora não tenha ouvido, José sabia que Ana fizera um comentário sobre ele ao grupo. A gargalhada de Diana, e o olhar de Júlia denunciaram Ana. Ela tinha pena dele, mas forçou também uma gargalhada, como se tivesse de fazer aquilo para pagar o seu lugar no grupo, como se tivesse que fazer aquilo para contentar Ana. 

As piadas sobre José eram motivo de gozo principalmente por parte de Ana. Nunca se sentira tão humilhado e desiludido com a amiga. Mas em ele sabia se ainda poderia considerar Júlia uma amiga. Foram dias de humilhação que José sofreu no frupo, até que o trabalho fosse concluído.

Durante todo o ano escolar, a relação de José e júlia nunca vira dias positivos. A presença de Ana e Diana ditavam o limite da amizade de José e Júlia.

- Aquele José… não sei como aguentas-te tanto tempo com ele. – disse Ana.

- Ele… é… boa pessoa.

- Ahahah. Essa teve piada amiga.

- Eu estava a brincar. – disse Júlia com medo de reação de Ana.

 

Capítulo III – O Outro

Demorou, mas finalmente José havia crescido. A coragem já começava a ver-se junto com todas as suas outras qualidades. Crescido, com uma nova imagem José enfrenta os agressores da sua escola sempre que eles se dirigem até si. O que é certo é que cada vez eram menos frequentes as visitas por parte deles. Mas muito mais coisas haviam mudado na vida de José.

No quarto ano do ensino básico, José começava a olhar com outros olhos a vida. Este foi sem dúvida o ano em que começaram a surgir grandes emoções, principalmente no coração de José. A aproximação a Júlia, começou logo no início do ano. Ana ainda estava de férias, e José aproveitou que Júlia não a tinha por perto para se aproximar. Mas nem tudo são boas noticias. Júlia estava apaixonada por um dos rapazes que agrediam José. Era o primeiro grande amor da rapariga. A raiva de José ferveu quando descobriu. Os sentimentos de José, também evoluíram neste tempo em que tanta coisa mudou. O coração voltou a aquecer. Aquele pedaço que sempre partilhara com Júlia voltara a ficar vivo. O ciúme foi outro sentimento descoberto por José. Medo de perder a amiga novamente. 

Ana voltou de férias em Outubro. Quando chegou viu-se obrigada a simpatizar com José, pois sabia que júlia voltara a contar com ele como seu baço direito. Ana agora só tinha que aceitar José no grupo. Diana voltara a juntar-se a José e Júlia só depois de regresso de Ana. Ali formou-se agora um grande grupo de quatro pessoas, de colegas, pois amizades ali só tinham duas, a de José e Júlia e a de Ana e Diana.

José começou a saber um pouco mais sobre a vida de Júlia. Quase que nem a reconhecia. A menina doce que ela era, já não existia. Júlia tornara-se uma jovem forte e rígida. Os traços de Júlia evoluíram com o passar do tempo, tornando-se uma pessoa mais adulta, mas ainda muito ingênua. José escutava sempre todos os desabafos, todas as opiniões da amiga, mas o pior era quando ela lhe pedia opiniões e colocava-lhe dúvidas sobre Tiago e José quase que explodia com o rancor, o ódio que sentia por ele, mas controlava-se e tentava sempre fazer com que Júlia o esquecesse, mas era impossível. Ela estava iludida.

O mês de Novembro chegou, e junto com ela o aniversário de Júlia. Mas ninguém imaginaria que este aniversário pudesse fazer tanta diferença na vida de Júlia, mas fez. Uma das prendas que Júlia recebeu foi um telemóvel. Esse telemóvel ditou muito do futuro de Júlia. Desde que o recebera como prenda de aniversário, Júlia passava agora grande parte do tempo a falar com rapazes que nem sequer conhecia. Já que não tinha sorte com Tiago, continuava à procura de outros rapazes para conhecer melhor. Os pequenos romances de Júlia foram muitos, mas nenhum fez Júlia esquecer Tiago. E se não o esqueceu até agora, daqui para a frente só iria ficar pior. Uma nova rival que luta pelo amor de Tiago chegara à escola.

Com toda esta agitação, Diana começava a sentir-se de parte no grupo. Essa fragilidade fez com que José se aproxima-se mais dela, de maneira a saber um pouco mais sobre a relação de Júlia e Ana. Diana sentia que Ana dava mais importância a Júlia do que a ela. E era verdade. O que aconteceu entre José e Júlia, acontecia agora entre Ana e Diana.

O último ano de José, Júlia, Ana e Diana naquela escola chegara. No ano seguinte todos iriam embarcar numa nova aventura, o ensino secundário.

Júlia tornara-se uma das pessoas mais populares daquela escola, e o facto de pertencer ao grupo dos alunos mais velhos que iriam em breve partir daquela escola davam-lhe um certo estatuto, tal como aos seus colegas do nono ano.

Novas rivais, novos amores, novas descobertas. O ano de Júlia e José começou mal. Os conflitos de Júlia por causa de Tiago atingiram uma dimensão nunca antes vista. Tiago tinha agora outra pretendente, o que significava uma nova rival para Júlia. A luta por Tiago chegou ao ponto de Júlia se envolver em agressões com a sua rival. O pior para Júlia foi quando ele se entregou à sua rival, aí Júlia entrou em tal estado de depressão e começou a fechar-se para si própria e a esconder-se do mundo. Só José a compreendia, pois já passara pelo mesmo. Ana passava agora grande parte do tempo com Diana. José sabia que Ana só pretendia andar na ribalta. Quando Júlia começou a seguir os conselhos de José e focar-se nos estudos, Ana começou a trocar Júlia por Diana, e foi aí que o grupo começou a desfragmentar-se. O ano já ia a meio quando Júlia começou a envolver-se com um novo amigo que conhecera nas redes sociais. Pedro, andava na mesma escola que Júlia, mas nunca se haviam falado antes. Júlia só não imaginava que essa pessoa pudesse ser o amor de Ana.

- José eu preciso de ir a um sítio. Para onde vais? – perguntou Júlia.

- Onde vais? Posso saber? – perguntou ele.

- Vou ter com um amigo.

- Eu fico aqui na biblioteca, a fazer o nosso trabalho de ciências.

- Se precisares de alguma coisa diz, que eu depois faço. – disse Júlia.

Júlia saiu da biblioteca e foi encontrar-se com Pedro. José ali ficou sozinho a fazer o trabalho de grupo. Tardes como essa começaram a ser frequentes, sempre que acabavam de almoçar, Júlia ia encontrar-se com Pedro e José ia até à biblioteca, ler um livro, ver o jornal, matar o tempo até à próxima aula.

- Olá José. Então o que fazes aqui sozinho? – perguntou Ana, como se estivesse no gozo com ele.

- Nada de especial. – respondeu-lhe.

- E por onde anda a Júlia?

- Eu acho que a vi passar por nós. – interveio Diana.

- Não vi. Sabes onde ela foi José?

- Encontrar-se com um amigo.

- A sério? Não acredito! E quem é esse amigo?

- Não sei.

- Sabes, sabes. Diz lá. Ela conta-te tudo.

- Já disse que não sei. – respondeu José.

- Como queiras então. Vamos embora Diana.

- Até logo José. – disse Diana, quando Ana já ia longe.

Realmente, José não sabia. Júlia nunca contava essas coisas a ele. Mas agora que Ana o confrontara com isso, ele ficara curioso. Afinal quem seria essa pessoa com que Júlia se encontrava? José fechou o jornal, pousou-o na mesa e saiu da biblioteca e correu em direção ao átrio. Não havia sinal de Júlia.

“Onde andará ela? Talvez nas traseiras da escola?” – pensou José.

Ele não pensou duas vezes. Saiu na porta mais próxima e deslocou-se às traseiras da escola. Quando estava a chegar ao local, começou a ouvir gritos e berros.

“Júlia? Ana? Diana? Não pode ser”. – pensou ele.

Caminhou um pouco mais e avistou Júlia a discutir com Ana. Diana tentava as acalmar.

- Tu és uma traidora! Menina mimada, sem vergonha! – gritava Ana.

- Cala-te, tu não sabes mesmo o que dizes! Só te preocupas com as aparências, em ser vista… - respondia Júlia em voz alta.

- Oh que lindo. Essas palavras são de quem? Do teu amiguinho José?

- Não, não são. São minhas! Agora desaparece, estou farta das tuas cenas.

José continuava ali à escuta. Ouviu-se uma quarta voz.

- Meninas por favor!

- Cala-te Pedro. Não te metas. Ela já está de saída, não é Ana? – disse Júlia.

- Isto não fica assim. Prepara-te. – disse Ana, e saiu dali. Diana correu atrás.

- Desculpa Pedro. Mas não dá para continuarmos. Desculpa.

- Eu compreendo. Foram bons os momentos que passei contigo. Nunca esquecerei.

- Nem eu.

- Então, até um dia. –disse Pedro a Júlia e foi embora.

José ficou ali imóvel. Não sabia o que pensar de tudo aquilo. Seria culpa dele? Dissera ele ago a mais a Ana do que o que devia?

- José? O que fazes aqui? – perguntou Júlia.

- Eu? Nada. – respondeu, atrapalhado.

- Estives-te a ouvir a nossa conversa? Diz a verdade, não mintas.

- Mais ou menos…

- Como assim, mais ou menos?

- Eu vinha à tua procura, e quando cheguei vi-te a discutir com a Ana. Acho que posso ter alguma coisa a ver com isso. Eu disse-lhe que estavas com alguém, mas que não sabia quem.

- Pois, esse alguém é o Pedro. Sabias que ela estava apaixonada por ele?

- O quê? Então por isso é que discutiram?

- Sim, foi basicamente isso. A culpa é dela. Se ela confiasse em mim como eu confiava nela, nunca me envolveria com ninguém de que ela gostasse.

 - E tu como estás?

- Triste, sozinha.

- Eu estou aqui.

- Sim eu sei. Vamos para a aula, já está na hora. – disse Ana.

O ano terminou. Ana não chegou a vingar-se de Júlia como prometera, pois sabia que ela havia deixado Pedro. E também deveria imaginar o porque daquilo ter acontecido, pois ela no fundo sabia que deveria ser mais aberta com a amiga, como ela era com ela. Os laços de amizade entre Júlia e Ana não voltaram a entrelaçarem-se.

 Júlia e José entraram numa nova escola. Diana e Ana ficaram separadas, mas em escolas diferentes da de Júlia e José. Os contactos começaram a ser cada vez mais escassos, Diana era a única que ainda falava para Júlia e José, até que um dia também deixou de falar para eles.

Uma nova etapa da vida de Júlia e José havia começado. Uma nova escola, novas pessoas, novos amigos foi assim que começou o novo ano escolar de Júlia e José, no ensino secundário. José passava agora muito tempo com Júlia. Nas aulas, nos intervalos, nas tardes livres, eram horas mágicas, recheadas de grandes conversas e aventuras, era como se tivessem recuado no tempo até à sua infância. A amizade voltara a ganhar as raízes necessárias para fazerem florescer os ramos, de novo. Ninguém conseguia decifrar o enigma que envolvia aquela amizade que estava cada vez mais forte.

 

Capítulo IV – O Sentimento

José sentia-se cada vez mais livre, mais inspirado, alegre e sobretudo sentia-se realizado. Não sabia bem porquê, mas tudo aquilo era bom para ele. Não havia avalanche nem tsunami capaz de fazer José mudar aquilo que sentia. A nova escola situava-se numa pequena vila a alguns quilómetros de suas casas. Os dois amigos nos tempos livres, passeavam, conheciam novos lugares, por vezes aproveitavam o tempo para os estudos, mas o melhor era mesmo toda a adrenalina que sentiam quando gostavam de ser rebeldes e fazer uma pequena asneira. Aí rebentavam as gargalhadas, a risota era tal, que sempre que algo de mal corresse eles corriam a fugir do perigo para não serem apanhados. Eram sobretudo brincadeiras de adolescentes, mas sempre dentro dos limites.

- Ai Júlia, Júlia. Tu não existes mesmo! – comentou José.

- Foi divertido ou não foi? – perguntou ela.

- Claro que foi!

- Sabes que mais? Tive uma ideia. Sabes onde podemos arranjar um jornal?

- Deixa cá ver… talvez na biblioteca municipal?

- Vamos lá ver então.

Júlia e José foram até à biblioteca, pegaram no jornal Última Hora e Júlia abriu, mesmo nas páginas centrais.

- Que vais fazer amiga?

- Vou apenas tirar aqui uns números de telemóvel. Já vais ver.

Júlia começou a copiar alguns dos números que se encontravam no jornal para o seu telemóvel.

- Olha aqui José, “faço massagem completa, com direito a brinde”. Esta vai ser a primeira.

Júlia depois de anotar vários números, saiu da biblioteca seguida de José.

- Vamos nos sentar ali naquelas escadas. – disse ela.

- Não vais ligar para “essas meninas”, pois não? – perguntou José.

- Tens algo melhor para nos entreter? Bem me pareceu que não.

Júlia e José ali ficaram a falar ao telemóvel com as meninas dos números de telemóvel que estavam no jornal. Marcavam encontros, pediam preços, enfim, a imaginação deles não tinha limites, a alegria era total. Momentos como estes, ficavam para sempre guardados na memória e no coração daqueles dois amigos.

A festa acabara de chegar à vila. Parecia um campo de batalha, a praça estava repleta de comerciantes que montavam as suas tendas, eletricistas que penduravam as iluminações pelas ruas, as padeiras a vender os doces tradicionais, os padres e sacristãos preparavam a igreja, as atrações para as crianças estavam a ser montadas, mas nada disso impediu que Júlia e José passeassem pela vila a vê-la preparar-se para mais uma festa.

No último dia de aulas da semana da festa, Júlia e José saíram da escola e foram percorrer todo o arraial que já estava montado a receber os visitantes.

- Vamos José. Tens que me pagar uma ficha ali nos carrosséis…

- Ok. Vamos lá.

Júlia agarrara José pelo braço e puxava-o para a zona dos carrosséis.

- Duas fichas por favor. – pediu José.

Iriam andar a voar pelo céu. Pendurados num dos cestos do carrossel, José e júlia começaram a sentir a adrenalina. Ela gritava, esticava os braços, mas José não era assim, era mais calmo e levava as coisas de outra maneira.

Iam já na segunda volta, quando Júlia distraída quase que escorrega, mas é segurada por José que a agarra a tempo. Ela ficou pálida. Embora aquilo continuasse a andar a uma velocidade louca, ela estava imóvel e olhava José nos olhos, completamente assustada.

Ele fazia o mesmo. Aquela troca de olhares aconteceu em segundos, mas para José parecia que foi um dia inteiro. Tanta coisa que havia surgido, pelo menos dentro da sua cabeça. Quando acabou de olhar júlia nos olhos, ele solta uma lágrima que lhe é logo sugada pela força do vento. Mas o que se passara com José? O que o fizera ficar também assim imóvel?

Era mais do que um olhar, mas do que um arrepio, mais do que uma sensação. Era um sentimento estranho, era gratidão, misturada com confiança, lealdade, era carinho, e agora José sabia o que lhe encaixar mais nesse sentimento, a paixão. Uma série de sentimentos abateram José no momento em que segurou Júlia e a olhou nos olhos. Mas tudo resume-se a uma só palavra quando todos esses sentimentos se unem, amor.

- Estás bem Júlia?

- Sim estou. Quero que isto pare, estou um pouco indisposta.

- Já está a abrandar. – disse José.

- Podem sair. – disse o empregado.

- Queres ir tomar um chã, uma água com gás?

- Não, não te preocupes. Já passa, foi só do susto.

Para José aquilo não foi apenas um susto, foi uma descoberta. Finalmente uma razão para tudo aquilo que vinha a acontecer dentro dele, já há muitos anos. O ódio que sentia por Tiago, na altura em que andava no ensino básico, o ciúme pela amizade de Júlia e Ana, era tudo amor. Amor, esse de que ele nunca suspeitara.

- Vamos até à escola buscar as mochilas para depois irmos apanhar o autocarro. – disse José.

- Vamos então.

- Queres vir amanhã comigo até aqui? Andar um pouco nos carrosséis, e passear por aí?

- Desculpa, mas já combinei com uns amigos. Mas se quiseres podes vir connosco.

- Não, deixa pra lá.

- A sério, anda connosco.

- Eu depois se vier, ligo-te.

- Tá bom, mas vê se bens.

Eles continuaram o percurso até à escola. José estava feliz, mas ao mesmo tempo sentia-se triste pela recusa do convite. Será que ela não compreendia que ele queria apenas estar com ela? Será que haveria sempre alguém na vida de Júlia que atrapalhasse José?

José começou aos poucos a descobrir melhor como era aquele amor que sentia. Cada dia, cada momento que estava com Júlia era uma peça no puzzle da sua vida. As respostas aos seus sentimentos é que não eram nada positivas. Na verdade, José não conseguia expor a Júlia aquilo que sentia. Medo. Medo de perder a sua única amiga, medo de estragar aquela amizade, medo de nunca mais conseguir falar com júlia. Medo de ser rejeitado.

O ano escolar continuou assim. Sempre metidos em aventuras, em brincadeiras, mas José não tinha coragem de falar com ela.

O Natal chegara. José decidiu oferecer uma lembrança a Júlia, na esperança que aquele pequeno gesto a fizesse despertar. Mas em vão. Nada mudara. A esperança de José estava esgotada. Não conseguia nem dizer, amo-te.

 

 Capítulo V – Coragem

A vida continuou. José continuava sem conseguir expressar-se para Júlia. Já estava quase a chegar a Páscoa e o tempo que José poderia passar com Júlia estava a esgotar-se pois em breve chagavam as férias de verão.

As aulas continuavam animadas, Júlia e José conseguiam transformar as longas horas de aulas, em momentos de alegria, com jogos e conversas discretas. Muitas vezes eram chamados à atenção, mas sempre tiveram um jeito próprio para não dar muito nas vistas.

O tempo trouxe também novos amigos a Júlia e José. Paula e Cátia são duas novas colegas de turma de Júlia e José. Depois de vários trabalhos de grupo, começaram todos a simpatizar.

- Querem vir connosco? – perguntou Júlia. - Vamos até à biblioteca estudar.

- Podemos ir. – disse Cátia.

- Então vamos. – finalizou José.

As novas amigas de Júlia e José eram diferentes de Ana e Diana. Mais independentes, maduras, inteligentes mas mesmo assim reuniam alguns defeitos que viriam a revelar-se.

Passou-se um, dois meses e José começou a não gostar muito da companhia de Paula e Cátia. Por vezes, tornavam-se de tal maneira chatas e aborrecidas que Júlia e José começavam a querer voltar a ficar a dois. Mas enquanto que José apenas queria Júlia só para si, ela só pensava em estar com José para se afastar de Paula e Cátia.

Paula e Cátia eram as típicas raparigas certinhas, inteligentes, sempre dentro das regras, e isso aborrecia e muito José e Júlia. “ Maldita a hora em que nos aproximamos delas” pensavam eles.

O fim do ano estava próximo. O calor começava a despertar, os corações ganhavam mais fogo. Júlia porém continuava indiferente, enquanto José continuava a sofrer em silêncio com a falta de coragem para se revelar a Júlia.

Júlia hoje faltara à escola. Quando José lhe mandou uma mensagem a perguntar se estava tudo bem, ela respondeu-lhe que estava doente. Hoje não iria à escola. Talvez só amanhã.

Sem companhia, José decidiu passar o intervalo na biblioteca a estudar. Pois, era melhor estar sozinho do que com Paula e Cátia.

- Desculpa, está alguém nesta cadeira? – perguntou uma rapariga a José.

- Não, ninguém.

- Então posso me sentar aqui?

- Podes, está à vontade.

A rapariga sentara-se na mesa junto a José. Enquanto José navegava entre os números, a rapariga estudava química.

- Desculpa, será que me podes emprestar a calculadora? Ham…

- José. – respondeu ele rapidamente.

- Podes me emprestar a calculadora José? - repetiu ela.

- Sim está à vontade.

- Eu sou a Daniela.

- Olá. É um prazer conhecer-te. – disse José. – Estudas química?

- Sim, sim. Estou a cursar análises, e química é das disciplinas mais importantes…

- Pois eu sei. Prefiro aqui a matemática. Não é que seja mais simples, mas é mais, diga-mos… diferente!

- Mas precisas de ajuda?

- Não obrigado. Eu safo-me.

A conversa ficou por ali. Depois cada um seguiu o seu caminho, e não voltaram mais a cruzar-se naquele dia.

- De volta à escola? – perguntou José a Júlia já no dia seguinte.

- Já estou melhor. E novidades?

- Nada. Continua tudo igual.

- Que seca esta escola! – disse Júlia com ar aborrecida.

José não contou nada a Júlia sobre Daniela. Preferia manter-se calado. Afinal, em nada ajudaria o seu enigma com Júlia. Se contasse o sucedido, as esperanças para com ela diminuam cada vez mais. Apesar de estar em zero, a esperança podia atravessar a barra até valores negativos, caso Júlia soubesse da conversa entre José e Daniela.

- Espera por mim aqui fora. Vou à casa de banho. -  disse Júlia, e afastou-se.

- Olá José! – disse Daniela.

- Olá Daniela. Tudo bem contigo? – perguntou-lhe.

- Tudo e contigo? Novidades? Como vai a matemática?

- Vai bem, obrigado.

- Queres vir dar uma volta?

- Desculpa, mas estou à espera de uma pessoa.

- Não faz mal. Vemo-nos por aí. Adeus.

- Adeus.

- Ah, podes dar-me o teu número?

- Sim claro.

José deu o seu número de telemóvel a Daniela e ela foi-se embora. Júlia quando chegou junto a José ela já não lá estava.

- Vamos para a aula?

- Claro! Já estamos atrasados. – disse José.

Mais um dia que se passou. Porém algo mudou. José tinha agora desenvolvido uma nova cumplicidade, uma nova amizade com Daniela, com quem trocava mensagens ou falava por chamadas, as aulas e a vida de cada um eram os assuntos que os dois abordavam nas suas conversas.

O ano estava a chegar ao fim. José acabara de ficar perplexo, a última mensagem de Daniela deixara-o sem palavras. “ Amo-te José. Descobri em ti a razão da vida, a felicidade. És o amor da minha vida.” Mas José sabia que o seu coração pertencia a Júlia. Não conseguia nem sequer esquecer isso por um momento. Ele sentia que não podia entrar numa relação, se estava apaixonado por outra, estaria a enganar Daniela, e sobretudo a si próprio.

“ Desculpa Daniela. Acho que a nossa relação não passa de uma relação de amizade. Desculpa se te dei falsas esperanças, mas não posso retribuir esse amor. Desculpa. ”  disse José numa mensagem a Daniela.

Foi a última mensagem a ser trocada entre aqueles dois números de telemóvel. Nunca mais se falaram, e na escola faziam-se desconhecidos. Valerá a pena José ter deixado Daniela por Júlia?

 

 

Capítulo VI – A Nova Aventura de Júlia

O verão chegou. Nesta altura Júlia e José separavam-se. Viam-se muitas vezes, pois moravam na mesma freguesia mas não era nada como nos tempos de aulas. Nesta estação do ano, a prioridade de cada um era a família. José passava grande parte do verão na praia com a família. Já júlia, tinha por hábito frequentar a piscina da vizinha quase todos os dias, pois os seus pais pouco gostavam de ir até à praia.

Em setembro, Júlia e José voltavam a encontrarem-se. Os primeiros dias de escola, serviam para debater entre eles tudo o que se passara no verão, o que fizeram, o que não fizeram, tudo era esclarecido entre eles. A cumplicidade voltara a ganhar animo entre os dois amigos.

Paula e Cátia continuavam na mesma turma de Júlia e José. Tentavam aproximar-se de novo deles, mas sempre que podiam, Júlia e José tentavam escapar da companhia delas. Porém elas estavam mais persistentes, seguiam principalmente Júlia para todo o lado. O sossego destes dois amigos, parecia ter os dias contados com a perseguição delas.

O segundo ano de Júlia e José naquela escola prosseguiu sem grandes acontecimentos até Janeiro. Nesse mês, começou-se a dar uma grande revolução. Foi um mês em que lutavam grandes sentimentos entre si, amor, ódio, raiva, ciúme, carinho, esperança, felicidade, tristeza, alegria, era como se todos os sentimentos se tivessem cruzado numa terceira guerra mundial. O motivo dessa guerra sentimental era Júlia.

Júlia conhecera Fábio. Fábio tinha 16 anos, estudava na escola que ficava do outro lado da estrada da escola de Júlia e José. Conheceram-se pelas redes sociais, como muitos outros dos amigos de Júlia, mas com este algo era diferente. Júlia parecia estar mesmo apaixonada por Fábio.

Tudo começou quando Júlia começou a passar grande parte das suas tardes livres na escola, enquanto José ia para casa. Júlia e Fábio começavam por encontrarem-se apenas nas tardes livres, depois começaram a encontrarem-se também nos intervalos das aulas, o que fez José voltar a ficar sozinho, ora a vaguear pela escola, ora a estudar na biblioteca, e acabou por chegar ao ponto de Júlia começar a faltar às aulas mais importantes para estar com Fábio.

- Júlia, faltar às aulas, isso já é demais! – disse José.

- Não te preocupes. – respondeu ela calmamente. – Ele também falta às dele.

- Pois, mas ele já está reprovado há muito, não tem sequer objetivos para a vida.

- Vê-la o que dizes, ele é meu namorado! – avisou Júlia.

- Como queiras, depois anda chorar no meu ombro.

- Deves achar que eu preciso de ti para alguma coisa?

- Pronto! Não digo mais nada, esquece que eu existo!

Cega. Novamente cega. Era assim que estava Júlia. O amor que sentia por Fábio fazia-a esquecer tudo aquilo que era importante naquele momento. Embora precisa-se de viver a vida, júlia também devia dar atenção aos seus estudos, ao seu futuro, mas não, preferiu dedicar-se a cem porcento ao romance com Fábio.

José voltou ao seu estado depressivo que hà muito já não o acompanhava. Voltara a imergir na solidão, as suas notas começavam a descer, a sua motivação a diminuir. Mas Júlia ainda estava pior. Com toda a atenção que dava ao seu louco amor, começou a perder a força de vontade que tinha para os estudos e as suas notas começaram a baixar também. A relação e Júlia e Fábio era como um caso de novela. Chegou o dia dos namorados, e ambos trocaram prendas que segundo eles simbolizavam o seu grande amor. Júlia ofereceu a Fábio um grande quadro com uma fotografia de ambos. Ele em troca deu-lhe apenas uma carta. Nessa carta expressava os seus sentimentos, os seus desejos e pedidos.

Júlia antes de mais, amo-te. A nossa relação é tudo para mim. Foste um barco que me acolheu quando andava no mar à deriva, foste o lume que acendeu a vela que é o meu coração. Sinto-me mais forte para encarar a vida desde que te conheci. Mas parece que não gostas de estar comigo, peço-te que estejas comigo e nem sempre vens, quero-te só comigo e preciso de suplicar para que venhas ter comigo. O que se passa meu amor? Porque não me dás mais atenção? Pensa em mim, nunca desistas de mim, aconteça o que acontecer.

Amote.

 Fábio

 

Uma semana depois de ler a carta, júlia respondeu.

Amor quero que saibas que também és tudo para mim. Em ti encontrei a força do amor, da razão de ser, encontrei um carinho especial que nunca sentira. Não entendo essas tuas palavras. Estou contigo sempre que posso, chego a faltar ás aulas para estar contigo, não posso te dar mais do meu tempo, tenho uma vida também! As minhas notas estão a baixar, preciso de mais concentração. Eu sei que tu não tens essa preocupação, logo no primeiro período do ano ficas-te reprovado. Mas eu tenho objetivos, tenho que voltar a recuperar os meus estudos para conseguir ter sucesso. Desculpa se te dou pouca atenção, mas tenta compreender. É o meu futuro que está em jogo.

Com amor,

 Júlia

Finalmente abrira os olhos! Júlia já não faltava tanto às aulas, agora só nos intervalos maiores e tardes livres é que se encontrava com Fábio. Embora ele quisesse passar mais tempo com ela, Júlia sabia que o seu percurso pessoal também era importante. Talvez as palavras de José fossem verdadeiras.

Voltou a aproximar-se de José, a trabalhar com ele nas matérias que tinha perdido, e aos poucos os dois foram recuperando as notas que se tinham ido a baixo e voltaram a estabilizar os seus estudos.

- Segue o meu conselho. Ele está a ser egoísta, ele só pensa nele. Se ele gostasse realmente de ti, sabia o que era melhor para ti, sabia que precisas de estudar, ele só está a pensar nele, não quer estar sozinho e usa-te como consolo sempre que quer. – disse José.

- Eu sei que tens razão. Mas eu gosto dele. E custa-me muito deixa-lo assim sozinho.

- Custa? E já te esqueces-te do que me contas-te ontem? Que eu saiba ficas-te aí a tarde toda para ficar com ele, e à última da hora ele resolveu não vir ter contigo. Acorda! Ele só te está a usar como uma bengala onde se apoiar quando não tem com que se entreter.

- Não fales assim! Eu também não sou nenhum brinquedo!

- Eu sei, desculpa. Era só uma maneira de falar.

Júlia e Fábio começavam a desentenderem-se. Quanto mais tempo ela estava com ele, mais ele queria que ela ficasse no encontro seguinte. Mas ela abrira os olhos, sabia que não podia desperdiçar assim um ano de estudos, e começou a estabelecer regras naquela relação.

Fábio nunca foi muito a favor dessas regras, mas com medo de perder Júlia aceitou-as, contrariado.

- Ele está sempre com ciúmes, agora não posso estar sequer cinco minutos com os meus amigos. Ele até de ti tem ciúmes! – disse Júlia a José.

- Deixa pra lá. Isso passa. Mas porque estás assim, quase a chorar? Que mais te disse ele?

- Ele… obrigou-me a fazer uma escolha… - disse Júlia a soluçar.

- Que escolha?

- Ele, ou os meus amigos…

- O quê? Não acredito, ele…

- Acredita sim! – interveio Júlia – Sempre com ciúmes de tudo e de todos, só me quer para ele a todas as horas, mas eu tenho uma vida, não posso viver apenas para ele.

- Tens que pensar naquilo que é melhor para ti. – aconselhou José.

- Eu sei. Mas tenho receio na minha escolha. Tenho medo das consequências.

- Quando vais falar com ele? – perguntou José.

- Amanhã. – finalizou Júlia a conversa.

 

 

Capítulo VII – A Conversa Final

O dia seguinte despertou. O sol que cobria o céu quando Júlia acordara havia desaparecido do céu. Este encontrava-se coberto de nuvens pretas, que a qualquer momento iriam fazer rebentar a tempestade. Júlia já estava no autocarro, quase a chegar à escola. José ia consigo, sentado no mesmo banco.

- Estás bem? – perguntou ele.

- Mais ou menos.

- A que horas combinas-te falar com ele?

- Depois de terminadas as aulas de hoje.

O dia permaneceu triste. O céu continuava a ameaçar com uma tempestade que ainda não rebentara. Júlia estava mais nervosa à medida que o tempo passava. José sentia-se cada vez mais preocupado com a escolha que ela podia vir a fazer. Certo, é que durante todo o dia Júlia pouco falou. Será um indício da sua escolha? Estará ela a fazer o que Fábio pediu e a afastar-se dos seus amigos? José tinha medo, medo de perder a sua única e grande amiga.

- Bem, chegou a hora. Vou indo. – disse Júlia.

- Eu vou contigo até à praça. Depois quando ele chegar eu deixo-vos a sós.

- Não é preciso. Mas já que encistes faz como quiseres.

Júlia e José dirigiram-se até à praça. O dia continuava escuro, Júlia estava cada vez mais tensa.

Ele estava a chegar. Fábio descia a avenida em direção à praça.

- Podes ir. Ele vem aí.

- Boa sorte Júlia. – disse José, e foi embora.

Júlia afastou-se do centro da praça e entrou no jardim que ficava ali ao lado. Sentou-se numa das mesas de pedra que ali se encontravam até que Fábio chegasse. Logo depois de ela se sentar, ele aproximou-se e por uns momentos ficaram ali a olharem-se nos olhos. O sino da igreja tocava as badaladas, eram três horas da tarde. A tempestade rebentou, a chuva começou a cair e os trovões a iluminar o céu.

- Senta-te. – disse ela.

- Não queres ir para outro lado? Está a começar a chover.

- Não tenciono demorar muito tempo. – disse Júlia. – Tens mesmo a certeza que é isto que queres? Pensa bem, eu nunca te pediria para fazeres tal escolha! São os meus amigos, a minha vida, os meus estudos, pensa em mim antes de falares!

- Eu já pensei.

- E então?

- Ou eu, ou os teus amigos. Assim não dá para continuar.

- Ai não dá? Pois então… tu amas-me?

- Sim, claro que te amo. Tudo o que te faço é por amor.

- Amor? Afastar-me das pessoas de que gosto para estar contigo isso é amor? Ou não será antes obsessão?

- Eu amo-te, acredita em mim.

- Então se me amas, deixa-me ter uma vida! Se me amas, gostas de me ver feliz, de me sentir realizada, fazes qualquer coisa por mim, se me amas só queres o melhor para mim! Mas não, não é isso que acontece!

- Não leves as coisas dessa maneira Júlia!

- Pois então, estamos dependentes da minha resposta? Nada te faz mudar de ideias pois não?

- Não.

Júlia levantou-se, deu uns passos e ficou de costas para Fábio. Ele virou-se, e perguntou:

- Júlia! A resposta?

Ela permaneceu virada de costas para ele por uns momentos. A chuva estava cada vez mais forte, ambos estavam todos encharcados. Um trovão forte acabara de cai ali perto. Tudo estremeceu. Júlia virou-se.

- Desculpa. Ficamos por aqui. A vida chama por mim.

Mal acabou de proferir essas palavras, começou a andar.

- Júlia! – gritou ele. – Se deres mais um passo, nunca mais te dirijas a mim.

Ela tinha parado para escutá-lo. Rodou a cabeça e olhou-o mais uma vez. Voltou a virar a cabeça e caminhou em frente. A vida esperava por ela.

A chuva continuou a cair. Junto com a água que escorria pelo seu rosto, vinham as lágrimas. Ela amava-o mas era melhor assim. Iria sofrer, mas deixar de viver por ele seria um sofrimento ainda maior.

Nessa semana Júlia pouco falou. José respeitou o seu silêncio e não tocou no assunto. Mas ele estava mais feliz, pois desconfiava que estivesse tudo acabado entre Júlia e Fábio.

 

Na semana seguinte Júlia decidira desabafar com José. Contara-lhe tudo o que acontecera no encontro, e ele escutara-a. Não podia negar, ele sentia-se feliz pela tristeza da amiga. Embora não fosse bem a tristeza dela que o fizesse feliz, mas sim o fim da relação dela com Fábio. Mas tão cedo Júlia não voltaria a confiar em ninguém. Não valia aa pena se declarar quando Júlia se encontrava tão frágil. O verão chegou. O ano escolar chegara ao fim.

 

Capítulo VIII – As Descobertas, o último ano

Nem Júlia nem José sabiam o que os esperava. Este podia ser bem o melhor ano da vida escolar destes dois amigos. Este era o último ano destes dois amigos naquela escola. Em breve iriam separar-se, e seguiriam para o ensino superior. Esses eram os objetivos deles. Júlia já esquecera Fábio, mas José permanecia com o coração em silêncio.

Um ano de aventuras, perigos, descobertas, foi assim que ficou marcado este último ano. Eles estavam mais maduros, mais cientes da vida, eram já jovens adultos. As fraquezas emocionais do ano que passara era motivo de risota sempre que falavam sobre o assunto. Júlia e José embarcaram novamente num ano de aventuras, o fator perigo era uma presença constante nos seus tempos livres. Para essas aventuras, Júlia e José continuavam crianças.

O ano começou bem para estes dois amigos. Com algum sucesso escolar, sem dramas e romances, mas as coisas começaram a mudar depois do Natal.

Júlia e José foram convidados para uma festa de aniversário. Sem dúvida que a noite prometia, mas José tinha uma personalidade rígida, era preciso muito para o derrubar.

- Anda lá José. Que queres beber? – perguntava Júlia.

- Não quero nada. E tu, acho que já chega de beber. Mal te seguras em pé.

- Relaxa... anda dançar!

- Sabes perfeitamente que eu não danço. Essa não é a minha praia. – respondeu ele.

- Oh. Então vou eu.

Júlia já estava bêbeda, mas José embora tivesse bebido alguns copos, não cedia assim tão facilmente à bebida. Nem à dança. Era uma paz de espírito.

A noite foi longa, José e Júlia tinha embarcado numa nova aventura, embora Júlia tivesse aproveitado melhor o momento.

- Não sei como consegues beber tanto. – disse José, já dias depois da festa.

- Oh, eu não bebi muito. Tu é que bebes-te pouco.

- Pois, pois para não falar dos cigarros…

- Oh, para com isso! É normal nas festas, nós queremos é divertirmo-nos…

- Está bem, está. Depois não digas que não te avisei.

 - Deixa de ser criancinha tu. Também não arriscas nada, a vida é curta. Temos que aproveitar tudo, e ao máximo.

- Ai é? Sou criancinha? Então o que quiseres que faça, eu faço para provar o contrário.

- Está bem. Então espera aqui. Já volto.

Júlia dirigiu-se a um café ali perto, e quando voltou chamou José para um sítio mais escondido dos olhares curiosos.

- Prova-me que não és uma criancinha. Fuma este cigarro.

 - Estás a brincar? Só podes… mas eu faço isso. Passa cá.

José pegou no cigarro, levou-o até aos lábios, hesitou, olhou de lado para Júlia mas depois chegou o fogo à outra ponto e puxou o primeiro gole de fumo. Ele engasgou-se pelo menos três vezes, mas levou o desafio até ao fim.

- Não acredito! Tu fumas-te!

- Sim, sim… e agora, ainda sou criancinha?

- Pois está bem… agora só tens que superar o meu recorde?

- Não nem penses, foi o primeiro e o último.

- Anda lá, só precisas de fumar cinco, numa noite.

- Cinco? Mas tu enlouqueces-te? E já agora, como conseguiste o cigarro se és menos de idade?

- As aparências enganam, ninguém liga a isso.

 O que é certo, é que José devia ter gravado todo o sermão que deu a Júlia. José desenvolvera um novo vício. Começou por de vez em quando fumar um cigarro com Júlia só para relaxarem, mas as coisas mudaram e José passou a fumar pelo menos um por semana. Não era vício, era mais como se tivesse que o fazer para se sentir bem, para sentir jovem, estava na idade de o fazer.

O ano continuou o novo passatempo de José tornava-se cada vez mais comum, e Júlia de vez em quando acompanhava-o. Júlia questionava-se muitas vezes porque José tomou essa atitude, ele não era assim. Mas ela estava longe de imaginar que ela fazia aquilo para se sentir bem com o mundo e com ele, ingénuo, pensava que fumar abriria o coração a Júlia para si, torná-lo-ia mais adulto a fim de Júlia reparar nele.

O mês de Junho estava a aproximar-se. Era o último mês de aulas, e haveria algo muito especial para acontecer. As raparigas vibravam, ficavam histéricas só de ouvir falar no assunto.

- Júlia, aceitas vir comigo ao baile de finalistas? – perguntou José.

 

Capítulo IX – O Baile de Finalistas

As raparigas cochichavam sobre os vestidos, os sapatos e os penteados. A noite com que tanto sonhavam. Os rapazes preocupavam-se em não se esquecer de comprar o fato certo para condizer com o seu par. O baile de finalistas é um dos momentos mais importantes da vida de qualquer estudante.

Júlia encontrava-se no centro do quarto. Na sua cama, estava estendido o seu vestido, com os sapatos ao lado. José apertava os últimos botões da camisa cor-de-rosa, e dava o nó na sua gravata cinza a combinar com o fato, e de seguida passou a escola de novo no cabelo, e calçou os sapatos.

- Pai? Estou pronto. Podemos ir. – disse José.

- Então vamos filho.

- Não te esqueças de passar por lá. – disse José.

- Eu sei. Não te preocupes.

O pai de José parou o carro junto à casa de Júlia. Apertou a buzina, e passado uns instantes a porta de casa dela abriu-se. Os seus cabelos pendiam em cachos, e brilhavam ao sol com os brilhantes que os cobriam, o seu vestido rosa transmitia toda a beleza que ela escondia, até aquele dia.

Júlia desceu as escadas da entrada, e entrou para o carro. Ninguém falou. José queria sorrir, queria dizer alguma coisa, mas acabou por deixar os elogios para depois. Quando chegaram à quinta onde se iria realizar o baile, José saiu do carro e abriu a porta a Júlia. O pai de José foi embora e eles ficaram ali os dois, sozinhos por uns momentos.

- Estás linda! – disse José.

- E tu também estás lindo! Que camisa gira, a combinar com o meu vestido! – disse Júlia ofegante.

- Vamos entrar? – perguntou José.

- Acho que primeiro temos de tirar uma fotografia, para recordação.

Depois de várias fotografias, Júlia e José prosseguiram para a tenda onde estava tudo a ser preparado. As raparigas vestiam grandes vestidos, das mais variadas cores, os rapazes acompanhavam-nas com os seus fatos de gala.

- Júlia! – gritou Paula.

- Oh não… - disse ela, baixinho.

- Vamos ficar na mesma mesa!

- A sério? Que bom… - mentiu ela.

- Vens para dentro? – perguntou Paula.

- Vou já, vai indo.

- Que seca, vamos ter que as suportar? – perguntou José a Júlia.

- Nem digas nada, não quero estragar a noite por causa delas.

- Mas, acho que temos que ir.

O jantar foi servido na normalidade. Quando acabaram de comer a sobremesa, alguns dos finalistas começaram a levantar-se e a encher a pista de dança.

- Acho que vai ser agora a valsa de abertura da pista. – disse José.

- Não faz o meu estilo. – respondeu Júlia.

- Vamos até lá fora, ao jardim? – perguntou ele.

- Vamos.

José e Júlia foram até ao jardim. Estiveram a fumar uns cigarros, a beber umas bebidas e ficaram ali a divertirem-se, longe de Paula e Cátia.

- Acabou a valsa. Agora sim, música potente! – disse Júlia. – Vamos dançar?

- Eu não gosto de dançar. Vai tu.

Enquanto Júlia foi dançar José ficou no jardim a fumar mais cigarros e a beber umas bebidas.  A noite estava a ser maravilhosa, José pela primeira vez teve a companhia de Júlia só para ele, numa data tão especial.

Passado uns instantes, ela voltou ao jardim.

- Ainda a fumar? Tu estás-te a sair… ai estás, estás. Quem te viu e quem te vê. Daqui a pouco a festa acaba aqui. Depois continua na discoteca lá em baixo. Vamos até lá?

- Podemos ir. – disse José.

Quando no relógio os ponteiros assinalavam meia-noite, começou a subir ao céu, uma descarga de fogo-de-artifício. Era o celebrar de uma vida académica. José e Júlia ficaram ali os dois, a observar o fogo, lado a lado.

- E acabou. Vamos até à discoteca?

- Bora lá. – respondeu José a Júlia.

José e Júlia foram a pé, enquanto muitos iam já nos seus carros. A noite estava quente. Júlia descalçou os sapatos de saltos altos que lhe magoavam os pés, e José desapertou os botões da camisa e alargou o nó da sua gravata. Estavam mais descontraídos.

- José, estou descalça. Ajuda-me, dá-me o teu braço.

Momentos depois José para e sentam-se no passeio por onde caminhavam.

- Júlia.

- Sim?

- É o último ano em que estamos juntos. Foram mais de dez anos sempre lado a lado. Com momentos altos, momentos baixos, mas sempre estivemos ali um para o outro. E agora num repente, como num piscar de olhos, tudo vai acabar. Vamos seguir por trilhos diferentes.

Ela permaneceu em silêncio, não disse nada. Momentos depois, ela abraça José.

- Isto não é um fim. – disse ela. – É apenas o início de uma outra fase das nossas vidas. Agora vamos crescer, amadurecer para mais tarde sermos capazes de enfrentar a vida. Vamos estar sempre juntos, vamos manter contacto todos os dias, e quem sabe não ficámos na mesma cidade a estudar? Nada está perdido. E a nossa amizade é a última coisa que quero perder agora.

- Por momentos sinto que tudo está a acabar, como se nos estivéssemos a aproximar de um abismo. É apenas a tristeza de deixar os amigos, e uma parte da nossa vida para trás. Mas, somos jovens e havemos de superar isso.

- É isso mesmo! – disse Júlia comovida. – Nós somos batalhadores. E nada nos deita abaixo.

José estendeu o braço para Júlia se apoiar e foram até à discoteca. O calor do corpo de Júlia no seu braço, causou um impulso emocional tão grande que José soltou uma lágrima sem querer. Júlia porém não reparara, e num momento despercebido ele levou a mão ao rosto e limpou-a.

A noite foi longa. A festa continuou. Júlia e José beberam mais umas bebidas, fumaram os últimos cigarros do maço de José e quando foram para casa, já mal se seguravam em pé. O pai de Júlia, para sorte dela, não fez nenhum comentário quando os foi buscar. Sem dúvida que foi uma grande noite. Poderia ser a noite perfeita para José se manifestar para Júlia, mas mais uma vez permaneceu no silêncio.

Os dias a seguir ao baile foram os mais tediosos para José e Júlia. Estavam de férias, mas ainda tinham os exames finais. Júlia e José voltaram a encontrar-se uma semana depois do baile para realizarem os exames do final do secundário. Antes do exame, falaram sobre a grande noite, os pormenores do baile, os vestidos, as comidas, enfim, nada ficou por dizer.

A campainha tocou. Estava na hora.

- Boa sorte Júlia. – disse José.

- Para ti também. – respondeu-lhe ela e seguiram de imediato cada um para a sua sala.

Os exames correram bem e Júlia e José. Em breve iriam entrar para a faculdade.

José conseguiu entrar no curso de marketing que tanto desejava. Júlia entrou em engenharia civil. Seguiram por caminhos diferentes, faculdades diferentes e em cidades diferentes.

 

 

Capítulo X – O desabrochar da Flor

O calor desta manhã era intenso. José acabara de acordar, e já transpirava. Tomou um banho, e foi-se arranjar. A viagem ia ser longa. Os termómetros já disparavam pela manhã, já há muito tempo que não havia um mês de Junho tão quente como este.

- As chaves do carro, a carteira, o maço dos cigarros, o telemóvel… acho que não me esqueci de nada. – dizia José em voz alta para si próprio.

José entrou no seu carro e partiu. A sua família esperava-o lá na freguesia de onde era natural. A viagem foi longa, José demorou cerca de quatro horas até chegar ao destino.

- Mãe, então como está?

- Estou bem. E tu filho?

- Ótimo. Tirando este calor. Quando saí de Lisboa já marcava trinta graus no termómetro. A viagem foi bem cansativa.

- E o teu emprego? Como está a correr?

- Graças a Deus, está a correr tudo muito bem. Tive muita sorte, mal acabei os três anos de curso, entrei logo depois de finalizar o estágio… e ainda… já fui promovido!

- Mas isso é maravilhoso filho! – disse a mãe toda orgulhosa.

- Eu sei. E o pai, onde está?

- Saiu. Ainda não chegou. O almoço ainda não está pronto, está um pouco atrasado. Chegas-te mais cedo do que o esperado!

- Não faz mal. Então, vou dar um passeio até ao centro.

- Mas despacha-te. Daqui a nada o teu pai chega.

- Ok mãe, até já.

José foi até ao centro da sua freguesia dar um passeio.  À cinco anos que José saíra dali para estudar marketing em Lisboa e tudo permanecia igual. José sentou-se num dos bancos que se encontravam lá na praça. Ficou ali a admirar e a recordar a sua infância. Seria recordação, ou mesmo realidade? Júlia estava presente nos seus olhos, mas ele demorou até perceber que não era uma ilusão. Ela estava mesmo ali.

- José? Estás bem? – perguntou Júlia.

- Júlia? Não acredito! És mesmo tu? Estás… grande. – disse ele.

- Olha quem fala. O senhor que agora só veste fatos e sapatinhos polidos. – disse ela sorridente.

- E tu?! Ah?! Que eu saiba também não te deste nada mal. Responsável pelo projeto da construção do grande centro comercial aqui da zona, o maior do Norte.

- Como sabes?

- Não te esqueças que já apareces nos jornais mais conhecidos do país.

- Tu lês-te o artigo? Sim, foi há cerca de um mês quando se oficializou a construção do centro comercial. Mas estamos aqui a falar e nem um abraço me dás? Que amigo…

- Não sei se me apetece. – disse ele com ar manhoso. – Anda cá amiga!

José agarrou Júlia e envolveu-a num grande abraço. De repente voltou a sentir um grande impulso. Despertara novamente. Aquele sentimento que tanto mexeu com ele à uns anos voltara.

- Júlia preciso que saibas uma coisa. Apesar da nossa amizade, há uma coisa que nunca consegui falar contigo, um segredo que nunca te revelei.

- O que é? – questionou ela.

- A vida deu muitas voltas. Nunca imaginaria que hoje fossemos pessoas realizadas assim. Pelo menos tu, deves ser. Eu não. Só me conseguirei tornar uma quando for capaz de te falar aquilo que me sufocou durante tantos anos em que estivemos juntos. Olha para mim.

José levou a mão ao queixo de Júlia, e num gesto de carinho passou-lhe a mão no rosto. Ficaram a olhar-se por uns instantes.

- Júlia, desde sempre que senti algo por ti. Demorei anos para descobrir o que era, mas demorei ainda mais anos para ganhar coragem e abrir-me para ti. Desde sempre que sentia em mim uma chama que ardia no meu peito sempre quando estava contigo, os ciúmes e inveja quando não estava. O que eu sinto por ti é mais do que um amor de amigos, é paixão, é desejo, é um carinho especial que não consigo expressar em palavras.

Por momentos ficaram novamente ali parados a olharem-se, até que José fechou os olhos e beijou Júlia. Foi intenso, apaixonado e romântico.

- José? – disse ela quando ele a largou. – O que estás a fazer?

Ele não respondeu. Ao invés disso, voltou a beijá-la. Desta vez ela retribuiu o beijo.

- Júlia. Perdoa-me. Não sei o que estava a fazer. Desculpa.

- Não precisas de pedir desculpa. Eu também sempre senti que havia alguma coisa mais entre nós. Mas ao contrário de ti só agora é que descobri. Por favor fica comigo.

- Estás a dizer… que me amas?

- Sim José. Tu acabas-te de despertar este amor. A coragem que tiveste para te revelares foi o golpe que faltava para o meu coração se abrir de verdade. Amo-te. – proferidas as palavras ela beijou-o.

- Fica comigo Júlia.

- Sempre.

Um ano depois do reencontro, Júlia e José casaram-se. Júlia montou um escritório de engenharia civil em Lisboa, para ficar perto de José assim que terminou a construção do centro comercial.

Eles estavam felizes. Pela primeira vez na vida sentiam-se realizados. Sempre juntos, quem sabe talvez já de outras vidas passadas. Um amor que nasceu fruto de uma grande amizade. Muitas vezes, o amor surge mesmo ao nosso lado e nem dá-mos conta. São sempre tão importantes coisas sem sentido que ficamos cegos para aquilo que realmente importa.

O amor não é fruto de um primeiro olhar, não aparece com um gesto mágico. Constrói-se, e é nessa construção em que envolvemos uma grande quantidade de sentimentos que surge o amor. Quando todos esses sentimentos se envolvem num só, nasce o amor fruto da lealdade, amizade, do desejo, da paixão e sobretudo do respeito.

 

F I M

 

Uma obra de: João Moreira (administrador blog)

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