quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Samurais e a Cultura Japonesa – Parte 3 (última)

 

O código do samuraiimage

Eu não tenho pais, faço do céu e da terra meus pais.
Eu não tenho casa, faço do mundo minha casa.
Eu não tenho poder divino, faço da honestidade meu poder divino.
Eu não tenho pretensões, faço da minha disciplina minha pretensão.
Eu não tenho poderes mágicos, faço da personalidade meus poderes mágicos.
Eu não tenho vida ou morte, faço das duas uma, tenho vida e morte.
Eu não tenho visão, faço da luz do trovão a minha visão.
Eu não tenho audição, faço da sensibilidade meus ouvidos.
Eu não tenho língua, faço da prontidão minha língua.
Eu não tenho leis, faço da auto-defesa minha lei.


Eu não tenho estratégia, faço do direito de matar e do direito de salvar vidas minha estratégia.
Eu não tenho projetos, faço do apego às oportunidades meus projetos.
Eu não tenho princípios, faço da adaptação a todas as circunstâncias meu princípio.
Eu não tenho táticas, faço da escassez e da abundância minha tática.
Eu não tenho talentos, faço da minha imaginação meus talentos.
Eu não tenho amigos, faço da minha mente minha única amiga.
Eu não tenho inimigos, faço do descuido meu inimigo.
Eu não tenho armadura, faço da benevolência minha armadura.
Eu não tenho espada, faço da perseverança minha espada.
Eu não tenho castelo, faço do caráter meu castelo.

(Autor desconhecido)

Kenjutsu

     Ao longo dos séculos em que permaneceram no poder, os samurais desenvolveram a mais letal e eficiente maneira de manejar a espada já criada pelo homem. A essa arte deu-se o nome de Kenjutsu, que significa "A Arte da Espada".
      Existem mais de 200 estilos de Kenjutsu registrados historicamente, pois, no Japão feudal, era comum que cada feudo possuísse o seu próprio estilo de manejar armas. As técnicas dão margem a todos os golpes possíveis e imagináveis com a espada. São 60 posturas de luta e centenas de golpes possíveis, que podem se adaptar conforme a situação.image
     As raízes mais remotas do Kenjutsu situam-se no período Kamakura, quando pela primeira vez os samurais tomam o poder no Japão. Mas, ironicamente, o auge do Kenjutsu ocorreu na "Idade da Paz Ininterrupta" - como ficou conhecido o xogunato dos Tokugawa, entre 1603 e 1868. Nessa época viveu o "Santo da Espada" , como ficou conhecido Miyamoto Musashi, que venceu mais de 60 duelos sem nunca ser derrotado. Musashi criou o estilo Niten Ichi Ryu, famoso por suas técnicas em que são utilizadas as duas espadas simultaneamente. O Niten Ichi Ryu é um dos poucos estilos de Kenjutsu que sobreviveram aos dias atuais.
     O Kenjutsu possui em sua filosofia e técnicas uma forte influência do pensamento Zen. Para o samurai, a sua espada não era apenas uma arma: ela continha a sua própria alma. Assim, o Kenjutsu não era simplesmente um modo de usar a espada com perfeição, mas um caminho espiritual que acabou influenciando a cultura japonesa como um todo.

Kendô

     Durante a conturbada Era Meiji, no final do século XIX, o poder volta para as mãos do imperador, que decreta o fim da classe dos samurais e a proibição do porte de espadas. Mas a arte da esgrima japonesa, com todas as suas técnicas e estilos e todo o seu grandioso refinamento aprimorado ao longo dos séculos, não poderia sumir de uma hora para outra. Era preciso uma nova arte marcial que mantivesse a tradição da espada japonesa.image
     Assim nasceu o Kendô, como uma simplificação e adaptação das técnicas do complexo Kenjutsu aos tempos modernos. O Kendô é um esporte com regras, pontos e campeonatos, baseado na esgrima samurai.
     Os treinos de espada no Japão feudal eram realizados com uma boken, a espada de madeira. Apesar disso, não era raro que um dos praticantes saísse fraturado do tatame, devido à violência dos golpes. Para que isso não mais acontecesse, no Kendô surgiram os equipamentos de proteção conhecidos como Bogu, baseados na clássica armadura dos samurais. O Bogu constitui-se de quatro partes: elmo (Men), protetor de mão e antebraço (Kote), protetor do abdômen (Do) e protetor das coxas e da virilha (Tare).
     Além disso, ao invés de usar uma espada de aço ou de madeira, ou praticantes de Kendô usam a shinai, que é uma espada feita a partir de 4 tiras de bambu. Esse material faz com que as pancadas sejam bem mais suaves, pois as tiras de bambu são flexíveis e amortecem os golpes.
     No Kendô os alunos treinam repetidamente seqüências de um mesmo golpe, para que, na hora em que lhe seja exigida a técnica, ela aflore naturalmente. Além disso, a constância no treinamento monótono e imagerepetitivo é um teste de determinação e disciplina.
     Após certo tempo de treinamento, o aprendiz já pode participar de um embate real. Contando com todos os equipamentos já descritos, e usando a espada de bambu, os praticantes simulam um duelo entre samurais, tentando acertar, com o máximo de precisão e técnica, os pontos vitais do adversário - golpes pré-determinados pelo esporte. Vence quem marcar o maior número de pontos. Dessa forma, o Kendô possibilita aos praticantes a emoção de poderem simular um duelo real entre samurais, sem que para isso ninguém precise morrer ou sofrer alguma fratura, como corriqueiramente acontecia no Japão feudal.
   image  Mas o sincero praticante do Kendô não busca apenas a perfeição técnica no manejo de espada. Assim como os antigos samurais, eles buscam o aperfeiçoamento do caráter através do caminho da espada, sendo essa a principal meta da prática. Isso porque o Kendô também faz parte do Budô, o conjunto das artes marciais de cunho filosófico e espiritual. Além do mais, não há muito sentido em buscar esse esporte como uma forma de defesa pessoal, visto que ninguém pode andar carregando uma espada por aí nos dias de hoje, e, mesmo que pudesse, a maioria dos golpes do Kendô levariam o adversário à morte se fossem aplicados com uma espada real.
     Apesar de algumas vezes o Kendô ser ensinado com propósitos puramente competitivos, a sua verdadeira essência consiste em passar os valores dos ideais samurais de honra, disciplina, dever e retidão de caráter.

Aikido

  Aikido é a arte marcial desenvolvida por Morihei Ueshiba na primeira metade do séc. XX, e tem por objetivo a completa união do homem com a natureza e a sociedade. A palavra Aikido significa literalmente "o caminho da harmonia através da energia vital".image

Muitos pontos fazem com que o Aikido seja bem diferente das outras artes marciais. Em primeiro lugar, não existem competições nem lutas. A arte consiste no aprimoramento pessoal, e nada tem a ver com chutes e socos visando à derrota de um oponente. Fisicamente falando, é uma técnica puramente defensiva, e todos os golpes objetivam a resolução imediata do conflito.

No Aikido, quem escolhe o que você irá fazer é o adversário, não você. Dependendo do tipo físico e do golpe do oponente é que o aikidoca se orienta, sempre conduzindo a força agressora através de movimentos circulares, nunca se opondo a ela. Além disso, todos os movimentos respeitam o princípio do Yin e Yang e requerem um estado de completa união com o Ukê (em japonês, "aquele que cai"). Sendo o Aikido um caminho para a harmonia, há uma grande preocupação em não machucar o adversário.

O cultivo da sensibilidade através da energia vital - o "Ki" - é um dos pontos mais importantes da arte. Alguns mestres acreditam que tudo no universo pulsa - e o próprio universo tem a sua pulsação. Assim, o objetivo último do Aikido seria a harmonização da própria pulsação, ou fluxo do Ki, com a pulsação do universo, ou Ki universal.

Morihei Ueshiba, o fundador, foi um incansável praticante de artes marciais. Era graduado em mais de 20 delas, e chegou a ter o cargo de Ministro das Artes Marciais do Japão. No entanto, sua busca era muito mais profunda do que a conquista de títulos e cargos honrosos. Ele procurava a essência do Budô - o conjunto das artes marciais de cunho filosófico e espiritual. Um dia, quando contava com 40 anos de idade, Morihei teve um "insight". Fora-lhe revelada a verdade que lhe permitiu posteriormente desenvolver e refinar sua própria arte marcial: a essência do Budô não estava no tornar-se invencível, mas sim no descobrir o amor e o potencial que existem dentro de cada ser humano. Assim nasceu o Aikido; como uma arte enraizada nas técnicas dos antigos samurais, porém nova, cheia de vitalidade, adaptada às necessidades do homem contemporâneo.image

A arte de Morihei foi mais fortemente difundida num momento muito turbulento da história - o fim da II Guerra Mundial. Numa época em que predominavam a destruição e a falta de esperanças no Japão derrotado, o Aikido foi um poderoso aliado de milhares de pessoas a superarem suas dificuldades. 

Posteriormente foram enviados diversos discípulos que ficaram encarregados de espalhar a arte pelo mundo, pois o fundador sempre dizia que o Aikido é universal, não deveria ficar preso a um só povo.

Em tempos de tanta violência como o atual, o Aikido é ainda uma eficientíssima forma de defesa pessoal. Por não usar absolutamente a força e ser todo fundamentado em movimentos circulares, por vezes se parece com uma suave dança que logo termina com um dos praticantes indo ao chão. Talvez por esses motivos seja a arte marcial que mais cresce no mundo entre as mulheres.

 

TEXTO EM PORTUGUÊS DO BRASIL

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