sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Sempre Que Te Vejo – Capítulo IV – “O Sentimento”

 

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Capítulo IV – O Sentimento

José sentia-se cada vez mais livre, mais inspirado, alegre e sobretudo sentia-se realizado. Não sabia bem porquê, mas tudo aquilo era bom para ele. Não havia avalanche nem tsunami capaz de fazer José mudar aquilo que sentia. A nova escola situava-se numa pequena vila a alguns quilómetros de suas casas. Os dois amigos nos tempos livres, passeavam, conheciam novos lugares, por vezes aproveitavam o tempo para os estudos, mas o melhor era mesmo toda a adrenalina que sentiam quando gostavam de ser rebeldes e fazer uma pequena asneira. Aí rebentavam as gargalhadas, a risota era tal, que sempre que algo de mal corresse eles corriam a fugir do perigo para não serem apanhados. Eram sobretudo brincadeiras de adolescentes, mas sempre dentro dos limites.
- Ai Júlia, Júlia. Tu não existes mesmo! – comentou José.
- Foi divertido ou não foi? – perguntou ela.


- Claro que foi!
- Sabes que mais? Tive uma ideia. Sabes onde podemos arranjar um jornal?
- Deixa cá ver… talvez na biblioteca municipal?
- Vamos lá ver então.
Júlia e José foram até à biblioteca, pegaram no jornal Última Hora e Júlia abriu, mesmo nas páginas centrais.
- Que vais fazer amiga?
- Vou apenas tirar aqui uns números de telemóvel. Já vais ver.
Júlia começou a copiar alguns dos números que se encontravam no jornal para o seu telemóvel.
- Olha aqui José, “faço massagem completa, com direito a brinde”. Esta vai ser a primeira.
Júlia depois de anotar vários números, saiu da biblioteca seguida de José.
- Vamos nos sentar ali naquelas escadas. – disse ela.
- Não vais ligar para “essas meninas”, pois não? – perguntou José.
- Tens algo melhor para nos entreter? Bem me pareceu que não.
Júlia e José ali ficaram a falar ao telemóvel com as meninas dos números de telemóvel que estavam no jornal. Marcavam encontros, pediam preços, enfim, a imaginação deles não tinha limites, a alegria era total. Momentos como estes, ficavam para sempre guardados na memória e no coração daqueles dois amigos.
A festa acabara de chegar à vila. Parecia um campo de batalha, a praça estava repleta de comerciantes que montavam as suas tendas, eletricistas que penduravam as iluminações pelas ruas, as padeiras a vender os doces tradicionais, os padres e sacristãos preparavam a igreja, as atrações para as crianças estavam a ser montadas, mas nada disso impediu que Júlia e José passeassem pela vila a vê-la preparar-se para mais uma festa.
No último dia de aulas da semana da festa, Júlia e José saíram da escola e foram percorrer todo o arraial que já estava montado a receber os visitantes.
- Vamos José. Tens que me pagar uma ficha ali nos carrosséis…
- Ok. Vamos lá.
Júlia agarrara José pelo braço e puxava-o para a zona dos carrosséis.
- Duas fichas por favor. – pediu José.
Iriam andar a voar pelo céu. Pendurados num dos cestos do carrossel, José e Júlia começaram a sentir a adrenalina. Ela gritava, esticava os braços, mas José não era assim, era mais calmo e levava as coisas de outra maneira.
Iam já na segunda volta, quando Júlia distraída quase que escorrega, mas é segurada por José que a agarra a tempo. Ela ficou pálida. Embora aquilo continuasse a andar a uma velocidade louca, ela estava imóvel e olhava José nos olhos, completamente assustada.
Ele fazia o mesmo. Aquela troca de olhares aconteceu em segundos, mas para José parecia que foi um dia inteiro. Tanta coisa que havia surgido, pelo menos dentro da sua cabeça. Quando acabou de olhar Júlia nos olhos, ele solta uma lágrima que lhe é logo sugada pela força do vento. Mas o que se passara com José? O que o fizera ficar também assim imóvel?
Era mais do que um olhar, mas do que um arrepio, mais do que uma sensação. Era um sentimento estranho, era gratidão, misturada com confiança, lealdade, era carinho, e agora José sabia o que lhe encaixar mais nesse sentimento, a paixão. Uma série de sentimentos abateram José no momento em que segurou Júlia e a olhou nos olhos. Mas tudo resume-se a uma só palavra quando todos esses sentimentos se unem, amor.
- Estás bem Júlia?
- Sim estou. Quero que isto pare, estou um pouco indisposta.
- Já está a abrandar. – disse José.
- Podem sair. – disse o empregado.
- Queres ir tomar um chã, uma água com gás?
- Não, não te preocupes. Já passa, foi só do susto.
Para José aquilo não foi apenas um susto, foi uma descoberta. Finalmente uma razão para tudo aquilo que vinha a acontecer dentro dele, já há muitos anos. O ódio que sentia por Tiago, na altura em que andava no ensino básico, o ciúme pela amizade de Júlia e Ana, era tudo amor. Amor, esse de que ele nunca suspeitara.
- Vamos até à escola buscar as mochilas para depois irmos apanhar o autocarro. – disse José.
- Vamos então.
- Queres vir amanhã comigo até aqui? Andar um pouco nos carrosséis, e passear por aí?
- Desculpa, mas já combinei com uns amigos. Mas se quiseres podes vir connosco.
- Não, deixa pra lá.
- A sério, anda connosco.
- Eu depois se vier, ligo-te.
- Tá bom, mas vê se bens.
Eles continuaram o percurso até à escola. José estava feliz, mas ao mesmo tempo sentia-se triste pela recusa do convite. Será que ela não compreendia que ele queria apenas estar com ela? Será que haveria sempre alguém na vida de Júlia que atrapalhasse José?
José começou aos poucos a descobrir melhor como era aquele amor que sentia. Cada dia, cada momento que estava com Júlia era uma peça no puzzle da sua vida. As respostas aos seus sentimentos é que não eram nada positivas. Na verdade, José não conseguia expor a Júlia aquilo que sentia. Medo. Medo de perder a sua única amiga, medo de estragar aquela amizade, medo de nunca mais conseguir falar com Júlia. Medo de ser rejeitado.
O ano escolar continuou assim. Sempre metidos em aventuras, em brincadeiras, mas José não tinha coragem de falar com ela.
O Natal chegara. José decidiu oferecer uma lembrança a Júlia, na esperança que aquele pequeno gesto a fizesse despertar. Mas em vão. Nada mudara. A esperança de José estava esgotada. Não conseguia nem dizer, amo-te.

Continua…

Leia ou Releia

Capítulo I - Memórias de Criança

Capítulo II - O Novo Ciclo

Capítulo III - O Outro

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